De olho no Congresso Nacional
Reforma trabalhista “é fruto de consenso”, diz ministro do Trabalho na comissão especial
Escrito por: Alysson de Sá Alves • Publicado em: 16/02/2017 - 17:41 • Última modificação: 29/10/2024 - 09:11 Escrito por: Alysson de Sá Alves Publicado em: 16/02/2017 - 17:41 Última modificação: 29/10/2024 - 09:11A comissão especial criada para analisar a reforma trabalhista enviada pelo presidente Michel Temer ao Congresso Nacional (PL 6.787/16) realizou, nesta quinta-feira (16), a primeira audiência pública. Foram ouvidos os posicionamentos do presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro Ives Gandra Martins Filho; do Ministro do Trabalho e Emprego (MTE), Ronaldo Nogueira, e do procurador geral do Trabalho (MPT), Ronaldo Curado Fleury.
“Reforma é fruto de ampla conversa”
O ministro do Trabalho e Emprego, Ronaldo Nogueira, fez questão, em sua fala inicial, de dizer que permanece disposto do diálogo, dando a entender que a proposta de reforma trabalhista em discussão no colegiado é fruto de consenso no movimento sindical, na sociedade e com os empresários. “Visitei sindicatos, federações, confederações de trabalhadores e patronais, e as centrais sindicais. Ouvi todos que querem um trabalho digno, criar oportunidade de novos postos de trabalho, consolidar direitos e dar segurança jurídica permanente às relações trabalhistas”, disse.
E prosseguiu: “não esteve e não está em nosso trabalho [PL 6.887/16] aumento da jornada de trabalho. Não esteve, não está e não estará ameaça a direitos do artigo 7º da Constituição Federal. O que estamos fazendo e dando força de lei à convenção coletiva e ao acordo coletivo para deliberar sobre 13 itens”, garantiu.
E o ministro finalizou sua participação inicial dizendo ter gente em sua família desempregada. “Precisamos modernizar a legislação trabalhista para dar oportunidade para todos”, defendeu.
“CLT não é velha, ultrapassada”
Ao contribuir no debate da discussão da reforma trabalhista consubstanciada no PL 6.787, o procurador geral do trabalho, Ronaldo Curado Fleury, não poupou críticas à reforma trabalhista comparando o modelo proposto com outros modelos de reforma implementados no mundo.
Iniciou sua apresentação enfatizando que “a CLT não é velha, ultrapassada e que precisa ser modernizada porque aproximadamente 85% da CLT foi modificada ao longo dos 74 anos de sua existência”.
Segundo o membro do Ministério Público do Trabalho, estudo de 2015 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) aponta que o mercado de trabalho nos últimos 20 anos apresenta diminuição da proteção ao emprego, não houve novos postos de trabalho, há maior precariedade, mais contratos temporários e salários mais baixos.
Experiências internacionais
“Na Espanha, em 2012, promoveram a diminuição dos contratos indeterminados. No México, onde a legislação trabalhista já é flexível, a reforma acabou por criar condições ainda mais precárias de trabalho, esses são dados da Revista Forbes”, disse o procurador.
Estudo da OCDE aponta que em países com maior rigidez nas normas trabalhistas como a Alemanha o contrato de trabalho a tempo parcial em 2007 aumentou a quantidade de desemprego.
Pontos combatidos da reforma
O PGT não poupou críticas à proposta de reforma trabalhista. “Dados da OIT apontam que, entre 2008 e 2013, houve o fechamento de 3,3 milhões de vagas de tempo integral e a contratação de 2,1 milhões de trabalhadores em tempo parcial. O resultado, portanto, foi a precarização das condições de trabalho”.
“Estão propondo a ampliação da jornada em tempo parcial de 25 para 30 horas e, no caso de até 26 horas, permitem a realização de hora extra. Mas querem também acabar com o registro de ponto. Vai ocorrer o fechamento de vagas em tempo integral e a contratação em tempo parcial. Se vai criar emprego porque não querem o registro do ponto?”, questionou.
O trabalho temporário de 90 para 120 dias precariza o trabalho e estimula a substituição de trabalhadores com contrato por tempo indeterminado por trabalhadores temporários. Onde fica a segurança jurídica que querem com a reforma?
Ao final, o Procurador Geral do Trabalho destacou que não há garantia no projeto de reforma trabalhista de que haverá aumento de emprego e deixou as seguintes perguntas para os participantes dos debates:
1) Que país queremos?; 2) Quem defendemos?; 3) A quem interessa retirar o controle do registro de ponto? Os bons e sérios empresários querem a permanência do ponto; e 4) Qual legado deixaremos para as próximas gerações?
Premissas convergentes e divergentes
O presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Ives Gandra, no início de sua fala disse que ali estava não como presidente da Corte, mas como “técnico que há 34 anos vive tentando compor conflito trabalhista”.
“Nós aqui concordamos quanto à necessidade de maior proteção aos trabalhadores, superação da crise econômica, mais capacidade produtiva, maior segurança jurídica, harmonia nas relações de trabalho, aumento da garantia social. Concordamos, portanto, com os fins, mas divergimos dos meios”
E prosseguiu: “queremos maior ou menor intervenção do estado?, queremos o sistema produtivo mais ou menos rígido? Queremos maior ou menor ativismo judiciário? São 3 milhões de ações na Justiça do Trabalho por ano. Queremos um sistema mais simples ou complexo de relações de trabalho?”
“A CLT foi reformada mas continua com uma série de divergências: teletrabalho e terceirização não estão regulamentados. Aliás, há vários dispositivos da Constituição pendentes de regulamentação. Hoje um fiscal do trabalho é juiz. Tem auto de infração de terceirização que é uma sentença, um tratado, um anacronismo da CLT. Precisamos modernizar, atualizar”, disse.
E prosseguiu: “dano moral, dano material e o pagamento de horas extras são temas recorrentes de ações no TST. Invocam o Código Civil e parâmetro de interpretação do Direito Civil quando o Supremo Tribunal Federal já tem decisão sobre temas que devem prestigiar o negociado”.
“As propostas de reforma apresentadas são positivas, fruto do consenso mínimo e com a participação de todas as centrais. Se não resolvermos o problema trabalhista e o problema econômico vamos virar uma Venezuela”, disse Ives Gandra ao final de sua defesa da reforma trabalhista.
Ao final, o presidente do TST apresentou ao relator, deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), sua proposta de reforma da CLT.
Geração de emprego só via crescimento econômico
O deputado Wadih Damous (PT-RJ) em sua fala foi enfático em afirmar que geração de emprego somente ocorre com crescimento econômico e um patamar mínimo de proteção social. “Se aprovada essa reforma colocaremos em xeque o processo civilizatório. Vamos ampliar o mercado de trabalho para os advogados trabalhistas porque essa reforma (PL 6787/2016) é contrário aos interesses e demandas dos trabalhadores”.
No entanto, garantiu o parlamentar carioca: “vamos participar de todas as mobilizações para barrar esse projeto”. E ministro do Trabalho, o senhor fica devendo dados técnicos que comprovam que haverá aumento do número de empregos com essa reforma”.
Reforma na contramão do país
O deputado Assis Melo (PCdoB-RS), destacou que emprego é gerado por desenvolvimento. E a reforma não dialoga com a inovação. O setor produtivo está perdendo para o setor financeiro.
“Esse projeto de reforma trabalhista é o desmonte do Direito do Trabalho”, disse o deputado Patrus Ananias (PT-MG). E enfatizando ensinamento da Igreja Católica relatou: “o trabalho prevalece sobre o capital nos ensina o Papa João Paulo II”.
(*) Jornalista e consultor do Diap
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PROJETO DE LEI
Art. 618 - A negociação coletiva entre entidades sindicais da categoria profissional e empresas ou entidades sindicais da correspondente categoria econômica poderá estabelecer normas e condições de trabalho diversas das legalmente previstas, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho, respeitados os direitos constitucionalmente assegurados.
§ 1º - No caso de flexibilização de norma legal relativa a salário e jornada de trabalho, autorizada pelos incisos VI, XIII e XIV do art. 7º da Constituição Federal, a convenção e acordo coletivo de trabalho firmado deverá explicitar a vantagem compensatória concedida em relação a cada cláusula redutora de direito legalmente assegurado.
§ 2º - A flexibilização de que cogita o parágrafo anterior limita-se à redução temporária de direito legalmente assegurado, especialmente em período de dificuldade econômica e financeira pelo qual passe o setor ou a empresa, não sendo admitida a supressão do direito previsto em norma legal.
§ 3º - Não são passíveis de alteração por convenção ou acordo coletivo de trabalho normas de segurança e medicina do trabalho, normas processuais ou que disponham sobre direito de terceiro.
§ 4º - Em caso de procedência de ação anulatória de cláusula de acordo ou convenção coletiva que tenha disposto sobre normas de medicina e segurança do trabalho, processuais ou de direito de terceiros, deverá ser anulada igualmente a cláusula da vantagem compensatória, com repetição do indébito.
§ 5º - Poderá ser instituída em convenção ou acordo coletivo de trabalho cláusula prevendo desconto para custeio sindical da atividade negocial coletiva, limitado a um dia de trabalho de cada um dos integrantes da categoria representada pela entidade sindical convenente, subordinado à não oposição do trabalhador, manifestado perante a empresa até dez dias antes do primeiro pagamento ajustado.
JUSTIFICATIVA DAS ALTERAÇÕES
A alteração do caput do art. 618 visa fundamentalmente a deixar claro que não se trata de prevalência do negociado sobre o legislado, mas de prestigiar a negociação coletiva, na esteira das Convenções 98 e 154 da OIT e do art. 7º, XXVI, da Constituição Federal.
Nesse sentido, trata-se de orientação bem diversa daquela sustentada no PL 944/15, bem como do PL 427/15, que também visam a atribuir aos juízes do trabalho a competência para homologar acordos extrajudiciais. O problema que se coloca com a atividade homologatória judicial é a de que hoje a Justiça do Trabalho já não dá conta da demanda judicial ordinária. Seria o caso de instar o STF a rever a jurisprudência que não admite a obrigatoriedade da passagem dos pleitos trabalhistas pelas comissões de conciliação prévia.
No que concerne ao § 3º, recoloca-se o que constava no caput original do art. 618 no PL 4.962/16, ficando num único parágrafo as vedações temáticas à flexibilização.
Problema conexo ao da negociação coletiva é aquele relativo ao custeio sindical da atividade negocia I, uma vez que as campanhas salariais anuais, pelo reajuste de salários e obtenção de outros benefícios e vantagens, implicam dispêndio substancial por parte das entidades sindicais, não cobertos satisfatoriamente apenas com a receita da contribuição sindical compulsória e da mensalidade dos empregados associados.
No passado, a cláusula de desconto assistencial sindical era prevista em convenções e acordos coletivos, mas alguns excessos no que dizia respeito ao seu montante, como também a discussão jurídica sobre seu caráter impositivo, levaram o TST a editar o Precedente Normativo nº 74 da SDC, segundo o qual "subordina-se o desconto assistencial sindical à não-oposição do trabalhador, manifestada perante a empresa até 10 dias antes do primeiro pagamento reajustado".
Posteriormente, o TST veio a mudar seu entendimento, editando o Precedente Normativo nº 119 da SDC, no sentido de que: "A Constituição da República, em seus arts. 5º, XX e 8º, V assegura o direito de livre associação e sindicalização. É ofensiva a essa modalidade de liberdade cláusula constante de acordo, convenção coletiva ou sentença normativa estabelecendo contribuição em favor de entidade sindical a título de taxa para custeio do sistema confederativo, assistencial, revigoramento ou fortalecimento sindical e outras da mesma espécie, obrigando trabalhadores não sindicalizados. Sendo nulas as estipulações que inobservem tal restrição, tornam-se passíveis de devolução os valores irregularmente descontados".
Ora, desde que se assegure ao trabalhador o direito de oposição ao desconto assistencial e que não precise dirigir-se ao sindicato para manifestá-Io, parece ser possível estabelecer cláusula de desconto assistencial, uma vez que seria voluntário e não obrigatório.
Nesse sentido é que se propõe o acréscimo de parágrafo ao art. 618 da CLT, que seria o § 5º em relação ao Projeto de Lei nº 4.962/16, de modo a que, no contexto de disciplinamento da negociação coletiva, ficasse também parametrizado o custeio da atividade negocial sindical, tal como se está parametrizando a própria negociação coletiva quando se trata de flexibilização de direitos laborais.
A proposta encontraria respaldo na própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, quando assenta que:
“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONTRIBUIÇÃO CONFEDERATIVA. COMPULSORIEDADE. INEXISTÊNCIA. 1. A contribuição confederativa instituída pela assembleia geral somente é devida por aqueles filiados ao sindicato da categoria. É inconstitucional a exigência da referida contribuição de quem a ele não é filiado. 2. Contribuição assistencial estipulada em convenção coletiva. Sujeição do desconto em folha à autorização ou à não oposição do trabalhador. Precedente. Agravo regimental não provido". (RE 461451 AgR, ReI. Min. Eros Grau, 2ª Turma, julgado em 28/03/2006, DJ 05-05-2006)
"Sentença normativa. Cláusula relativa à Contribuição assistencial. Sua legitimidade desde que interpretada no sentido de assegurar-se, previamente, ao empregado, a oportunidade de opor-se à efetivação do desconto respectivo". (RE 220700, ReI. Min. Octávio Gallotti, 1ª Turma, julgado em 06/10/1998, DJ 13-11-1998).
Assim, é de todo pertinente aproveitar a regulamentação da negociação coletiva no Projeto de Lei 4.962/16 para se resolver a questão de suma importância referente ao custeio sindical da negociação coletiva, nos moldes do dispositivo ora acrescido ao art. 618 da CLT.
Fonte:http://www.diap.org.br